O Caminho da Luz é uma trilogia em literatura de cordel que conduz o leitor a uma viagem entre a terra, o céu e o inferno na companhia do saudoso padre Sabino Gentille que deixa esse plano em 08 de julho de 2006. É elaborado em três episódios onde a 1ª parte é a Chegada de Padre Sabino no Céu; 2ª parte: Sabino no Inferno e a 3ª e última parte: Sabino Volta ao Céu. Assim, quero convidá-lo para embarcar nessa viagem fantástica e aproveitar esse instante de leitura. Boa viagem.
A CHEGADA DE PADRE SABINO NO CÉU
E foi na década de dez
Pleno século vinte e um
No ano dois mil e seis
Que surgiu um zum, zum, zum:
O padre Sabino Morreu
Em busca do bem comum.
Foi um choque para o povo
Que estava desprevenido
Sabino foi viajar
Mas havia prometido
De voltar pra Mãe Luíza
Com seu plano resolvido.
Pena que não deu certo.
Na sua terra, ficou.
Ele ouviu o chamado:
”A sua hora chegou.”
E nada pode fazer,
Da carne se libertou.
O povo chorou em coro
Mas tudo foi consumado.
Enquanto muitos choravam
Os anjos no outro lado
Tramavam quem desceria
Para pesar os pecados.
Nos portões grandes do céu
Sabino havia entrado
Estava na recepção
Para ser interrogado.
Só dependia que o anjo
Fizesse o apanhado.
O anjo veio à terra
No corpo dum passarinho
Pra ouvir opiniões,
Anotá-las num bloquinho
Pra confrontar a história
E indicar o caminho.
O pássaro pousou num galho
Duma pequena mangueira
Onde um grupo conversava
Numa ação corriqueira,
Da vivência de Sabino
Na comunidade inteira.
“Ele era muito justo!”
Disse assim uma velhinha.
“Ele vendia a miséria
Daqui da nossa terrinha
Pras terras dos estrangeiros
Pra ganhar uma graninha”.
Falava todo empolgado
Um senhor de meia idade.
“Ele trouxe o progresso
Pra nossa comunidade”
Disse uma senhora
Usando um tom de verdade.
O senhor continuou:
“Ele quebrou tradição,
Costume, crença e valor
Da nossa população
Deixou a gente carente
De uma religião.”
O passarinho ouvia
E tudo ele anotava.
A opinião do povo
Era tudo que faltava
Pra juntar com o relatório
E o julgo terminava.
Então voou mais um pouco
Em outra localidade
Outro grupo comentava
Mostrando seriedade:
“Ele construiu coisas
Pra toda eternidade.”
“Ele foi um professor,
Filósofo e estudante,
Foi pai, padrasto e padrinho
Do beato ao traficante;
Foi nessa comunidade
O homem mais importante!”
O pássaro ouvindo isso,
Achou o suficiente.
E voou para o céu
Agora bem consciente.
Chegando, se transformou
No anjo, urgentemente.
Foi direto ao arquivo
Pois já estava atrasado
E pegou dois relatórios
Pra serem analisados
Mas deu uma ventania
Foi folhas pra todo lado.
Ele foi juntando as folhas
Sem perceber o teor
E correu pro julgamento
E deu ao inquisidor.
Que olhou para Sabino
E disse sem muito amor:
“Na opinião do povo
Você tem a salvação.
Mas, consta no relatório
Crimes contra a nação.
Sua sentença é o inferno
E cem anos sem perdão.”
Zé Gonçalves e Zé Ruído
Tentaram uma intervenção
Alegaram que trocaram
A ficha de acusação
Confundindo o Sabino
Com o lendário Lampião.
SABINO NO INFERNO
Lit. de cordel – Wilson Palá
Parte II
E nos portões do inferno
O fogo era escaldante
Sabino olhou pra cima
Achando muito intrigante
Pois o seu lugar no céu
Vivia bem confiante.”
O secretário do diabo
Anunciou: “Pode entrar!
Aqui não tem julgamentos
É pra qualquer um morar.
Eu só não posso dizer
Se tu daqui, vai gostar.”
Pelos portões do inferno
Sabino foi adentrando
O calor era tão grande
Que ele foi avermelhando
Mas o diabo gritou:
“Você vai se acostumando.”
Deram-lhe uma picareta
Para ele trabalhar
Jogaram-no num buraco
Disseram: “pode cavar
Daí você vai fazer
O seu verdadeiro lar.
Pois começou a cavar
Nenhum lugar não chegava
A quentura lhe invadia
A sola dos pés estourava
E a água que bebia
Com mais sede ele ficava.
E continuou cavando
Não podia descansar
Não tinha hora pra nada
Nem começar, nem findar
Só se ouvia a ordem:
“Nunca pare de cavar!”
Os dias foram passando
E ele muito cansado
Nem se escorar, podia
Era quente em todo lado.
Até que um belo dia
Percebeu o resultado.
De tanto ele cavar
O buraco atravessou.
Caiu num vale perdido
E muita gente encontrou
Ainda muito cansado
Do povo, se aproximou.
Gente de todo tipo
Estava ali empilhada
De terno e de batina
Sem roupa, despenteada
Com expressões de espanto
E a perna acorrentada.
Sabino se aproximou
Quase que foi devorado
Por sorte, alguém falou:
“Solte esse condenado
No livro está escrito:
De cima será chegado.”
“Quero água, por favor!”
Disse assim e desmaiou.
Quando tornou, percebeu
Que algo, nele, mudou.
Estava muito disposto
Achava até que sonhou.
Quando abriu os olhos
E olhou ao seu redor
Viu que tudo era real
E nada ficou melhor.
Em torno da multidão
Só esperava o pior.
Aquele povo exigia
Uma boa explicação
Queriam compreender
A resposta da questão
Como ele conseguiu
Encontrar essa nação?
Para não causar espanto
Sabino foi explicando:
“Eu estava convencido
Quando me via cavando,
Que em algum lugar se chega
Quando se vai caminhando.”
“Mas aqui nesse lugar
Ninguém nunca apareceu;
Nunca houve novidades,
De nada aconteceu;
Só conhecemos o ciclo
Do nasceu, viveu, morreu.”
“Não sabemos a nossa origem,
Nem o que, aqui, fazemos.
Vivemos acorrentados
Desde que nos entendemos
Depois daqui, ninguém sabe
Para onde nós iremos!”
“Ele é nosso salvador!”
“Lá de cima ele desceu!”
Gritava a multidão
Querendo sair do breu.
“Vem nos mostre o caminho
Que o livro prometeu.”
Todos ali, esperavam
Encontrar a salvação.
Sabino muito esperto
Prestava muita atenção
E esperava o momento
Pra sua intervenção.
Quase vinte mil pessoas
Lutavam por sua sorte
Passavam o tempo todo
Brigando por ser mais forte
E encontrar a saída
Do vale da sombra da morte.
Sabino subiu numa pedra
E gritou pra toda gente:
“Ouça, ó multidão:
A salvação é ciente
Mas só será conseguida
Se for quebrada a corrente”.
O povo indignado
Rosnava aborrecido:
“Isso não pode ser”!
“Que cara mais atrevido”!
“A corrente que mantém
O nosso povo unido”.
“Valedasombradamortienses,
Ouçam o que vou dizer:
Só quebrando as correntes
Algo pode acontecer.
A liberdade não vem
Tem que buscar para ter.”
Sabino falando isso
Por muitos foi aplaudido
Uns, que já eram líderes
Sentiam-se invadidos
Pois quebrando as correntes
Ficavam desprotegidos.
A maioria do povo
Não se lembravam de nada
Como era, afinal,
Na sua vida passada
Por isso que a outra vida
Era desacreditada.
Começou a acontecer
Uma grande confusão
Quem rompeu com as correntes
Seguiu-se em procissão
Em busca de liberdade
E duma nova nação.
E por onde se passava
Mais pessoas se engajavam
Na luta pela verdade
Que há muito procuravam.
E no caminho, Sabino
Muitas coisas os ensinavam.
Começaram a plantar,
Ter seus próprios alimentos
Tomar banho, estudar,
A curar dos ferimentos;
Muitos já praticavam
Coisas dos pensamentos.
Já estavam acreditando
Que não tinham que sair;
Que a tal da liberdade
Já passara a existir.
Havia feito estradas
Para poder ir e vir.
Quem não quebrou as correntes
Começou logo a tramar:
“Temos que pôr um fim
Nesta festa popular!”
E chamaram o diabo
Que veio analisar.
Quando o diabo chegou
Já tinha um plano tramado:
“Vamos exterminá-lo
Sem precisar ser julgado
Ele é subversivo
E será apedrejado.”
E perseguiram Sabino
Sem pena, sem piedade.
Embora, já fosse tarde.
Ele plantara a verdade
E os seus ensinamentos
Pra toda eternidade.
E o diabo tramou
Uma grande traição
Quem entregasse Sabino
Passaria a ser um cão
Governaria a área
Dos pecados de extorsão.
Um, dos seus, o entregou
E ele foi condenado.
Em praça pública foi preso,
Humilhado e torturado.
E com choros e aplausos
Ele foi apedrejado.
E das nuvens apareceu
Um anjo indignado
Que gritou: ”Venha Sabino
O juiz estava errado
O seu lugar é no céu
E já está reservado.”
III PARTE
SABINO VOLTA AO CÉU.
Lit. cordel: Wilson Palá
Sabino subiu ao céu
Por quatro anjos, içado.
Pela justiça do diabo
Estava sendo julgado
Com a ordem do divino
Ele foi arrebatado.
O povo vendo aquilo
Passou a acreditar
Que ele, realmente, foi
O escolhido a salvar
Todos, da escuridão
Tida naquele lugar.
E cultuaram Sabino,
Todo seu ensinamento;
Pregavam o bem comum,
Buscavam conhecimento.
Ramificaram o seu nome
E todo o seu pensamento.
Sabino tão ansioso
Para no céu adentrar
Sonhava em conhecer
O que era esse lugar,
Como se vivia ali?
Quem iria encontrar?
E foi chegada a hora
Da sua introdução
Na vida celestial
De tanta inspiração.
Soaram com as trombetas
Pra se abrir o portão.
E uma luz grandiosa
Invadiu lhe por inteiro
Ficando maravilhado
Por sentir-se verdadeiro
Mas o portão se fechou
Ele ouviu o ordeiro:
“Esse é o caminho
A vida e a verdade
O merecido que entrar
É pra toda eternidade.
Se transformará em luz
Guia da humanidade” .
“Lá não terás sentidos
Tudo será razão;
Não existirá ‘eu acho’
Apenas a perfeição;
Tudo será mantido
Na divina proporção.”
“É lá que define os sonhos,
O nascer e o morrer,
Que dá destino à vida;
Que faz feliz ou sofrer
É lá que é definido
O sentido de viver.”
Sabino, pois, perguntou:
“E eu tenho outra opção?”
“Você pode não entrar
E ficar nessa seção
Onde trabalha os anjos
Na administração.”
“Aqui se pesa pecados,
Algumas preces, atende;
Reencarnação urgente
Aqui, também empreende;
Até conflitos com o diabo
Nesta seção que defende”.
“Existem outras seções
Que você pode seguir:
Tem a seção de resgate
Ou a de abduzir
As almas do purgatório
Que estão prontas pra vir”.
“Tem a seção das florestas,
Dos rios, dos animais;
Lembre-se que aqui no céu
Nós somos todos iguais
Não importa onde esteja
Ninguém é menos, nem mais".
“Agora ouça o que eu digo:
Que para chegar à luz
São poucos os escolhidos
A prática quem lhes conduz
Pois, andará com cristo
O nosso senhor, Jesus”.
Sabino fechou os olhos
Para a transfiguração
E os portões se abriram
Em uma imensidão
De luzes, que lhe solvia
Rumo a eternização.
Nos sonhos e pensamentos
Encontrar-se-á Sabino,
Em um nascer d’uma flor,
Num sorriso de menino,
Em toda luz que ilumina
Esse mundo pequenino.
Fim.
W.P